Acerca da justiça e fraternidade

Davilson Silva-

Assim como não se pode construir uma casa sem alicerçá-la, tampouco se poderá construir a justiça sem uma base fraternal, fundamentada no ato de se desejar ao próximo o que desejamos para nós, isto é, a caridade no mais alto grau segundo o nosso amado Mestre Jesus.1 O mais legítimo dos sacrifícios, o verdadeiro trabalho, o maior louvor a Deus consiste no esforço para se ser justo; portanto, a maior de todas as glórias, de todas as graduações deste mundo é a virtude da justiça! 

Há quem ache a caridade mais importante que a justiça... Sim... Porém... convenhamos! A caridade é o templo do qual só a justiça pode ser a base. O sociólogo John Ruskin (1819/1900)2 disse com força e serenidade que é preciso se edificar sobre a justiça pelo fato de, geralmente, não se possuir, no começo, a ideia da caridade necessária à construção. “Esta é a última recompensa do bom trabalho”, afirmou. Completou Ruskin, recomendando: “Sede justos para com vossos irmãos (podeis ser justos, ameis a eles ou não) e concluireis por amá-los; sede injustos para com eles, porque não os ameis, e acabareis por odiá-los”. 

Em princípio, justiça significa a virtude de se dar a cada um o que é seu, o meio pelo qual podemos agir conforme o direito, mas, também, sobretudo, conforme a fraternidade, resultante do amor ao próximo. Somente justiça e fraternidade serão capazes de levar a cabo a tão sonhada paz social, ambas um dever que não permite sentido diverso ou análogo, o que tanto interessa a homens e mulheres de bem de todo o planeta.

Esse duplo dever figura um preceito para conosco mesmo e para com os outros. Tal encargo consiste no que há de mais básico e seguro, o que diz respeito à união e convivência dos seres humanos como membros de uma imensa família, resumo do ato de julgar segundo o direito e melhor consciência em defesa e responsabilidade. 

Em geral, às paixões se mistura o julgamento, alterando o sentido de justiçaJustiça, exatamente falando, é feita com concórdia, reiteramos, e ninguém, nenhum chefe de qualquer nação conseguirá garantir ausência de guerras, de toda sorte de distúrbio social, de atentados contra pessoas, instituições, a pretexto de “liberdade” sob justificativas arbitrárias e unilaterais.

O conceito de justiça que nos determina a dar a cada um o que lhe pertence deveria predominar acima de quaisquer controvérsias. A justiça constitui-se em um desses axiomas que transcendem. Pois bem. Não há como estabelecer ordem sem a exemplificação do reparo e honradez, não existe estrutura organizada capaz de garantir as esferas específicas da vida social como as instituições básicas, suas atividades e correspondências que vigoram entre si. 

O julgamento da maneira mais íntegra possível seria o determinante de todas as ações humanas. Tudo, em nossa sociedade, teria que começar pela justiça como um sagrado dever recíproco de todo indivíduo, porque direitos e deveres possuem correlação entre si — ao se cumprir estes últimos, possivelmente os primeiros hão de ser cumpridos.
  
Reinará, sim, a fraternidade na Terra, não a fraternidade de momento que, por ora, vige, geralmente, visando algum tipo de interesse, mas a que conduz ao vínculo sincero.  Presumir que isso é impossível é duvidar da sabedoria e benevolência de Deus, ainda que nEle se acredite.4 Há, portanto, perfeita correlação entre justiça e fraternidade, esta outra tarefa do homem para com seus semelhantes, que jamais será um direito formal, uma obrigação prescrita. 

A verdadeira justiça fundamenta-se no critério de se querer para os outros aquilo que se quer para si mesmo. E não há como se ser justo sem um sentimento fraterno. Justiça e Fraternidade: muitas vezes, uma lei rígida, mas “suave”. Remetendo-nos à esplêndida menção de nosso Mestre ao nos oferecer o Seu  “jugo” essa lei tão-somente nos recomenda a observância do amor ao próximo por amor a Deus.5 E ponto final

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1. KARDEC, Allan. O evangelho segundo o espiritismo. 58. ed. São Paulo: Lake — Livraria Allan Kardec Editora, cap. 15, item 4 a 6.

2. Também crítico e ensaísta, o mencionado sociólogo inglês, cujo amor pela natureza e o profundo sentimento religioso caracterizaram o seu pensamento em um estilo vigoroso e elegante, autor de Pintores ModernosAs Sete Lâmpadas da ArquiteturaAs Pedras de Veneza, etc.;

3. KARDEC, Allan. O livro dos espíritos. 62. ed. São Paulo: Lake — Livraria Allan Kardec Editora, cap. 11, q. 874. 

4. _____. Obras póstumas. 11 ed. São Paulo: Lake, parte primeira, pág. 168, do terceiro parágrafo em diante.

5. _____. O evangelho segundo o espiritismo. 58. ed. São Paulo: Lake, cap. 6.o it. 1 e 2.


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